sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Anísio (interinamente) Capítulo Quarto


  Até conseguirem explicar que focinho de porco não é tomada, Anísio recebeu a benesse de passar doze dias dormindo em um colchão de concreto, em uma cela com o décuplo da quantidade máxima prevista para ali habitarem.
  Não bastasse, após sua despedida, verificou que o dinheiro que ainda restava em sua mochila, não era sequer um décimo de sua fortuna. Não sabia por que, mas parecia que todos seus sonhos, a partir daquele momento, se tornariam um pouco mais difícil de se realizarem.
  Mesmo com as desculpas dos oficiais da lei, sua irresignação era tamanha, que Anisio pretendia o quanto antes fazê-los se arrependerem do mal que causaram. A prepotência dos seus carrascos, culminaram em assassinar o resto do rapaz do interior que insistia em sobreviver dentro dele.
  Se sentia cansado e sozinho, mas agora, mais do que nunca, sabia que ninguém lhe daria a mão, ninguém lhe socorreria de tal infortúnio. Sentia que a humanidade lhe virara as costas, como nunca sentira igual. Percebia que seu mundo de fantasia, era apenas isso, uma mera ilusão e que, mais dia, menos dia, acabaria por descobrir. No entanto, acreditava que devia estar preparado quando isto acontecesse. Mas, não estava.

...

  Abordou um transeunte, em busca de informações vitais àquele momento:

  _ Amigo, tudo bem? Iniciou. Sabe onde fica um restaurante bom e barato aqui por perto?

  _ É assim, aqui não tem nada, mas, você tá do que? Perguntou um bom curitibano.

  _ Tô de circular. Apressou-se em responder Anísio, antes que o passante desconfiasse dele.

  _ Então faz assim, pega qualquer ônibus que passar naquele ponto ali. Apontou o sujeito. Pede pro cobrador pra descer na Praça Rui Barbosa, daí lá você pergunta pra alguém que com certeza vai ter algum lugar lá perto. Concluiu o bom homem, já se afastando.

  Mal deu tempo para Anísio agradecer e o sujeito continuava seu caminho.
  Apesar de tudo que já lhe acontecera, nosso azarado amigo, acabou por descobrir uma face desconhecida da sociedade da capital social, pois, conforme seus conterrâneos lhe alertaram, o povo curitibano era um povo frio e de poucos amigos.
  O que, abrimos um parêntese, é um disparate. Primeiro, porque a maioria das cidades que não fazem parte da região de Curitiba, se consideram cidades provincianas de São Paulo, não sendo capacitados para tecerem qualquer comentário sobre a maravilhosa cidade de Curitiba. Nada obstante, também deve se levar em conta, o fato de que apenas confiamos nas pessoas em que conhecemos, razão pela qual leva tempo para fazermos amigos, o contrário de nossos demais conterrâneos, que fazem amigos entre desconhecidos, mas não confiam naqueles que mais conhecem.
  Já que se falava em província do Estado de São Paulo, cabe lembrar que o Estado do Paraná há muito tempo emancipou-se. Esta crítica, na verdade, se remete a um discussão que se veria a seguir, em um boteco da Emiliano Perneta. Passava na televisão um noticiário esportivo e Anísio resolveu, como de costume, puxar papo. Não imaginava os desdobramentos que revelar torcer para um clube do futebol paulista lhe traria.
  As vezes, as pessoas não entendem como uma discussão sobre o adorado esporte pode fazer esquecermos dos problemas, independente do tamanho deles. Tal explicação é antiga, pois, se Marx afirmou que a religião era o ópio do povo, mutatis mutandis, diria que o futebol é o crack popular.

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