domingo, 29 de agosto de 2010

Anisio (Interinamente)

Ele sabia que sua família gritaria. Sabia que podia contar com todos naquele momento. Mas estava sozinho. Cansado e sozinho.

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Era verão e o sítio da família em Cruzeiro do Oeste estava rodeado pelas Araucárias que aos poucos caminhavam à extinção. Anísio era um menino de seus dezessete anos incompletos, forte como seus ascendentes, com a saúde tal qual melhor fruto da miscigenação brasileira.

Um garoto um tanto quanto simples para sua idade, não havia conhecido garota que lhe tivesse dado ou chamado à atenção. Sonhava com as histórias que sua avó lhe confiava. Acreditava que viveria um amor desde o primeiro beijo, que seria eterno enquanto durasse. Que a vida seria um mar de rosas e que rosas não tinham espinhos. Ledo engano.

Não detinha grandes ambições, queria apenas um lugar, alguém, para chamar de seu. Eu sua doce ilusão, viveria para sempre a roda da mesa da cozinha, aconchegando-se na poltrona do avô que há tempos partira. Seria o eterno companheiro de sua avó, sua futura esposa, filhos e netos, a alegrar a casa.

Alguém esquecera de avisá-lo que a vida nos prega peças. Ou, ao menos, deviam ter-lhe dito, que tudo é finito. Ou, talvez, por tudo que já lhe acontecera, deviam achar que ele já sabia. Mas não, e deixaram que ele começasse a gozar a vida da pior forma, pela morte:



No malfadado dia, mais precisamente numa tarde quente e ensolarada de terça-feira, Anísio levou os cães para correr entre as arvores do quintal.

Sequer viu a fumaça que lentamente saia pela janela de sua casa. Quando percebeu, o fogo já consumia vorazmente e de maneira atroz a pequena casa onde com certeza estaria a única pessoa que amava de sua família. Ainda que corresse, sabia que não chegaria a tempo de tentar qualquer reação. Irracionalmente, correu. Com certeza alcançou o recorde mundial dos 1.500 metros com muitas barreiras, chegando a tempo apenas para ver sua querida mãe/avó, que jazia debruçada sobre o que ainda não havia sido destruído da mesa, enquanto o causador de tamanha desgraça, encontrava-se imponente sobre a tábua de passar roupas.

Em questão de segundos Anísio se lançou para fora da casa, vendo as suas costas seu refúgio e porto seguro, morto e em cinzas. Não teve sequer tempo de dar uma beijo de despedida. Lhe foi furtado até o direito de abraçar seu único e mais querido ente. Ele sabia que sua família gritaria. Sabia que podia contar com todos naquele momento. Mas estava sozinho. Cansado e sozinho.

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